
Envelhecer.
Ninguém quer envelhecer, é ótimo sentir-se jovem, imaginar uma vida pela frente, com inúmeras possibilidades e disposição física para realizá-las. Mas a verdade é que a população está envelhecendo e muito rapidamente; a geração nascida entre 1946 e 1964, hoje representa uma população que, pela primeira vez, está vivendo uma velhice longa e com expectativa de muitos anos de vida. Se antigamente uma pessoa de 50, 60 era considerada idosa, hoje esse conceito não é mais verdadeiro, até porque os “velhos” mesmo, estão chegando aos 80, 90 ou mais de 100 anos!
E o que se faz com tantos anos quando uma aposentadoria chega antes mesmo de completar os 50? Essa é a história que Eugênia Deheinzelin, ou D. Gini, para os mais íntimos, compartilhou com esse grupo que se deliciou com seu jeito espirituoso e jovial, enquanto falou um pouco de sua vida, seu trabalho, preferencias e o “velho” nos tempos atuais.
Eugenia tem 89 anos, mora com seu companheiro Bill, e tem uma família linda, entre eles a querida Lala Deheinzelin, sua filha, nossa futurista e especialista em Novas Economias. Eugênia ainda trabalha, isso mesmo, trabalha com traduções em cinco idiomas, atualmente publicações na área da medicina. Teve uma trajetória profissional fabulosa em diversas empresas de São Paulo, sua contribuição é rica e extensa, isso, com certeza, daria um longo texto. Hoje ela faz questão de manusear os aplicativos no seu celular e também enfatiza que não gosta da palavra “idoso”. Para ela, a palavra correta deveria ser “velho” mesmo, por isso, em sua homenagem, optei por usar somente esta palavra.
Quando perguntamos o que não gosta da velhice, ela encabeça a lista com “a verdade é que ninguém quer te ouvir”, hoje as informações vêm de maneira muito mais rápida pela internet, mas mesmo assim, ela aconselha que o velho precisa ser curioso e se atualizar, se interessar por tudo. É importante para seu cérebro aprender algo sempre, exercitar para não enferrujar e ela sabe do que está falando com toda certeza.
O desconforto com as mudanças no corpo é inevitável e é preciso saber aceitar estas mudanças e conviver com as limitações. Este desgaste é natural, tudo acaba demorando mais que o desejável, mas tudo bem, o importante é seguir, nesse ritmo bem lento mesmo.
Procura ouvir os filhos, principalmente porque a última coisa que quer é dar trabalho para eles. Isso nunca. Obedece às orientações e não se queixa, porque se velho for falar o que sente, passaria o dia todo reclamando das dores. É melhor não falar nada para não aborrecer ninguém, comenta Eugênia sabiamente.
Para os homens é pior aceitar a velhice, ela acredita, eles se cobram uma performance para a sociedade e por isso não se permitem sentir. As mulheres, por outro lado, se permitem falar sobre o assunto, se reunir, fazer atividades e isso as mantem ativas. Nossa reunião mostrou essa realidade, mulheres de idades diversas e de vários cantos de São Paulo, interessadas em ouvir essas sabias dicas de quem vive com alegria e bom humor.
Para driblar a velhice, conta Eugênia, bom mesmo é conversar e ouvir os outros, nada mais prazeroso do que juntar amigos e família em volta da mesa. Esta receita é infalível, assim como caprichar no visual, se arrumar e perfumar, nada de chinelo e pijamas – isso nunca!
Abaixo, a Eugênia compartilhou com a gente algumas dicas para envelhecer melhor:
- Ficar quieta e ouvir
- É oportuno aceitar a mudança desse compasso de vida e quem está ao lado entender esse compasso. Não se preocupar com isso, não sofrer com isso
- Não reclamar de dor; se acostume – aceite, faz parte do jogo
- Sempre fazer coisas; seja curioso, se mantenha sempre ativo, corpo e mente em movimento
- Pavimentar o caminho para outros evitarem cometer esses erros
- Use a tecnologia, tente manter-se atualizado
- Sabia ouvir os mais velhos; passe a ter mais humildade; quando se está velho é importante saber ouvir os outros, principalmente os filhos, eles sabem das coisas também.
- Se permitir errar
- A gente foi feita para navegar – esse navegar ainda é atual ao contrário do externo que está lento (em referencia ao corpo que tem outro ritmo)
- Acolher sempre a troca entre gerações, a importância do transgeracional
- Toda experiência precisa ser sistematizada – não pode se perder; é inestimável o valor de cada pessoa com sua experiência, conhecimento e percepções.
- Mude
Esta última dica, é especialmente bela e importante, principalmente vinda do poema da Clarice Lispector, vale a pena ler cada frase, assim lembraremos sempre da Eugênia e suas valiosas dicas enquanto vamos percorrendo nossa iluminada estrada rumo ao futuro.
MUDANÇA
Mude, mas comece devagar, porque a direção é mais importante que a velocidade.
Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho, ande por outras ruas,
calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas.
Dê os seus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.
Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia,
ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda.
Durma no outro lado da cama…
Depois, procure dormir em outras camas
Assista a outros programas de tv,
compre outros jornais… leia outros livros.
Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes,
novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia.
O novo lado, o novo método, o novo sabor,
o novo jeito, o novo prazer, o novo amor.
A nova vida.
Tente.
Busque novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.
Almoce em outros locais,
vá a outros restaurantes,
tome outro tipo de bebida,
compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo,
jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado… outra marca de sabonete,
outro creme dental…
Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores.
Vá passear em outros lugares.
Ame muito,
cada vez mais,
de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas,
troque de carro, compre novos
óculos, escreva outras poesias.
Jogue os velhos relógios,
quebre delicadamente
esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco.
Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros,
outros teatros, visite novos museus.
Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só.
E pense seriamente em arrumar um outro emprego,
uma nova ocupação,
um trabalho mais light, mais prazeroso,
mais digno, mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as.
Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa,
longa, se possível sem destino.
Experimente coisas novas.
Troque novamente.
Mude, de novo.
Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores
e coisas piores do que as já
conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança,
o movimento, o dinamismo, a energia.
Só o que está morto não muda!
Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco,
sem o qual a vida não vale a pena!!!
Clarice Lispector
Agradecimento especial ao lindo projeto RECEITAS PARA SER FELIZ da Daisy Klein e esta bela oportunidade de juntar pessoas curiosas e amorosas numa bela noite de abril.
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